Astrologia e Livre-arbítrio

Essa é sem dúvida uma questão delicada, justamente porque este é um dos argumento que é comumente usado contra a astrologia: “se a astrologia for verdade, então o livre-arbítrio não existe. Como o livre-arbítrio existe, logo a astrologia não existe, ou a astrologia não é verdade”.
Esse tipo de afirmação parte de um entendimento equivocado do que seja a astrologia, e parte principalmente de uma formulação equivocada da conceituação da astrologia propagada recentemente  e que é assumida pelo senso comum como a astrologia. Vamos dar uma olhada na descrição dada por um livro contemporâneo escrito por um historiador não-astrólogo sobre a astrologia, já que ele reflete o pensamento que o senso comum tem sobre a Astrologia, pensamento esse que é sustentado por um vasto número de astrólogos contemporâneos:
“Astrologia é o estudo das estrelas e planetas e do seu efeito sobre o comportamento humano. Ela assume que existe uma correspondência entre o céu e a terra, expressa pela frase ‘assim como é em cima, é embaixo’, e que a posição dos corpos celestes influencia personalidades, eventos e assuntos neste planeta. Acredita também que o microcosmo dos seres humanos espelha o macrocosmo do universo, isto é, ‘assim como é do lado de dentro, é do lado de fora’. Nascida da magia e do augúrio, a astrologia reflete um impulso primordial para prever o futuro e faz parte da antiga procura pelo auto-conhecimento. Desde a antiguidade, ela tem oferecido um caminho para atingir uma forma superior de consciência, uma visão mística do real. As estrelas há muito são vistas como portas para um outro mundo, e até como portões do céu.”  
Na verdade essa conceituação atual do que é a astrologia é muito mais uma formulação moderna. Nos livros de astrologia tradicional você não encontra esse tipo de definição, o que os autores tradicionais faziam era transmitir uma tradição, que não teve um momento certo de surgimento. O que temos é a datação dos registros mais antigos associados a uma prática rudimentar de astrologia, que tem mais de 6000 anos de existência. Assim o surgimento da astrologia data de uma época em que muita coisa recebia uma explicação mítica ou sagrada. Ao longo dos séculos a astrologia sofreu diversas metamorfoses, e a astrologia que usamos hoje em dia no ocidente passou antes pelas mãos de muitos povos em muitas épocas. É possível que cada um deles tivesse o seu entendimento do que era a astrologia na época, mas esse é um conhecimento que não chega até os dias de hoje com muita clareza, a não ser a partir de gregos e romanos. Mas já na época de gregos e romanos a astrologia já existia a pelo menos 3000 anos!   
Mas vamos pensar cuidadosamente no conceito que tiramos do livro. Em primeiro lugar, a astrologia não estuda ‘estrelas e planetas’ e estuda menos ainda os efeitos que ‘estrelas e planetas’ supostamente teriam sobre o comportamento humano. Quem estuda ‘estrelas e planetas’ é a Astronomia, ciência que durante muito tempo existiu apenas para suprir os dados necessários para a astrologia, além das necessidades de orientação marítima e  de marcação do tempo. Hoje em dia A Astronomia tem vida própria e vai muito além do que foi originalmente, o mesmo não podendo ser dito sobre a astrologia. A astronomia é hoje um saber totalmente independente e evoluiu de forma avassaladora. A astrologia continua ainda hoje precisando da astronomia da mesma forma como a astronomia era a séculos atrás, e isso ocorre porque o céu, objeto de estudo da astronomia, é usado como instrumento pela astrologia. E os conhecimentos usados pela astrologia são os mais rudimentares oferecidos pela astronomia, porque tem na maioria dos casos uma perspectiva geocêntrica. Isso é porque a astrologia trata da percepção do céu visível a partir da terra e do uso que se faz dele pra compreensão e acompanhamento do transcorrer do tempo.   
A astrologia durante milhares de anos não foi um estudo do comportamento humano, e continua a não se tratar disso. A psicologia é a ciência do comportamento humano e existe a menos de 200 anos. A astrologia existe a mais de 6000 anos e durante a maior parte da sua existência tratou de questões relacionadas ao tempo em circunstâncias e situações completamente mundanas. Dizer “que a astrologia reúne em si todo o conhecimento da antiguidade sobre a psicologia” chega a soar exagerado por que faz pensar que a psicologização da astrologia é um processo muito antigo. Mas antes do surgimento da psicologia jamais houve um interesse genuíno do homem sobre a sua subjetividade, a não ser o esboçado por alguns filósofos da antiguidade. Hoje em dia o uso da astrologia pra entendimento da personalidade e do comportamento humano pode até se justificar, mas isso ainda não faz da astrologia uma “ciência do comportamento”. A Psicologia é a ciência do comportamento. Usar a Astrologia em conjunto com a Psicologia é uma coisa, dizer que a astrologia é uma ciência comportamental é outra, e trata-se de um erro. Não é errado usar Astrologia e Psicologia de forma conjugada, mas é necessária essa diferenciação, e sim, ainda hoje a astrologia pode ser usada de forma completamente independente da psicologia, e muitos astrólogos usam a astrologia exclusivamente dessa forma. Muito embora a demanda maior na sociedade ocidental seja por esse modelo moderno que visa o autoconhecimento. 
“Ela assume que existe uma correspondência entre o céu e a terra, expressa pela frase ‘assim como é em cima, é embaixo’, e que a posição dos corpos celestes influencia personalidades, eventos e assuntos neste planeta.”
Não é bem assim. Colocando de forma simples, a Astrologia estuda a passagem do tempo procurando entender as qualidades de cada momento. O relógio usado na astrologia para marcar o tempo é o céu, onde os signos (e não as estrelas, e essa diferenciação é fundamental) marcam as horas, e onde os ponteiros são os planetas errantes. A astrologia não estuda eventos, não estuda pessoas , mas a astrologia é aplicada sobre eventos e pessoas. Porque eventos ocorrem num local do espaço-tempo, as pessoas nascem num local do espaço-tempo e tem uma trajetória que é a refletida pela indiferente passagem do tempo. É a qualidade do momento em que surge uma pessoa ou evento que é estudada pela astrologia, e é a trajetória no tempo feita pela pessoa ou evento ou coisa que são também estudas pela astrologia. Isso é astrologia.
Na meteorologia  a previsão do tempo é feita principalmente através de modelos que analisam condições atmosféricas baseados também no histórico  de dados relativos as condições climáticas no passado. Mas uma forma rudimentar de se prever o tempo é dizer, por exemplo, que aqui em Florianópolis estará mais frio em julho do que esteve em fevereiro. O conhecimento do fato de que sempre em todos os meses de  julho fez mais frio do que em fevereiro, me da segurança para dizer que certamente julho será mais frio do que fevereiro, ainda que possam ocorrer pontualmente determinados dias mais quentes em julho do que determinados dias de fevereiro. Da mesma forma uma previsão do tempo feita inclusive com imagens de satélite pode indicar a possibilidade de chuva, não garantir, porque existe o imprevisto, que talvez possa ser encarado como o “livre-arbítrio” do nosso planeta.
Fato é que a astrologia prevê o futuro com base no passado, ela dá significados ao futuro, descreve a qualidade de tempo que vamos experimentando com o passar dos dias, meses e anos, apontando também a relação da qualidade de tempo do momento atual com a qualidade de tempo original dada pelo momento do surgimento da pessoa, coisa ou evento. Não existem “influências”, é um estudo do desenrolar natural das coisas, do descortinar do tempo. O livre-arbítrio humano é absolutamente garantido, os astros são absolutamente indiferentes às sortes ou azares humanos. Ao longo do tempo desenvolveu-se toda uma tradição em torno dos significados de cada planeta, signo e lócus celeste, gerando o complexo sistema simbológico da astrologia, com o qual qualificamos o tempo.